30-09-2020, 11:11 AM
Citação:[...] Carpeaux disse que estava numa festa em Viena e que havia um sujeito estranho, solitário num canto, e que ele foi lá falar com ele. Perguntou o nome dele. E ele respondeu alguma coisa como "Kaua...", porque ele já tinha a laringe totalmente tomada pela tuberculose e não conseguia mais falar com clareza. Aí ele perguntou lá pra uma pessoa na festa quem era o fulano e disseram que ele era um escritorzinho de terceira, que não tinha nenhuma importância, um sujeito estranho e maluco [...]".
Qualquer coisa que eu comente sobre o Kafka ou sobre suas obras será pouco em comparação com as brilhantes análises do professor Monir, inclusive esse trecho citado é do Expedições Pelo Mundo da Cultura em que ele analisa O Processo.
Eu considero o Kafka um daqueles escritores que ou você ama ou você odeia, não existe meio termo, ou você se identifica com as obras dele e cria uma conexão instantânea com elas e com os personagens entrando de cabeça no universo kafkiano ou então permanece fora mesmo, a conexão é imprescindível nesse processo, sem ela o livro perde todo o seu brilhantismo.
É impossível falar de Kafka sem citar o Max Brod e olha como as coisas são engraçadas, é difícil chegar a alguma conclusão sobre esse "crime" de publicações póstumas principalmente porque o Kafka era um tanto quanto pessimista e perfeccionista também não admitindo uma obra inacabada ou malfeita, mas fica a incógnita se o Kafka disse aquilo no intuito dos escritos serem de fato publicados (um desejo ególatra) ou se realmente não conseguia destruí-los por puro apego a eles, mas isso é irrelevante uma vez que o próprio Brod disse em seu julgamento que se o Kafka quisesse de fato obliterar seus textos incompletos, teria pedido isso ainda em vida.
Penso que, se Kafka pudesse voltar a vida, talvez estranhasse o fato de que as obras que ele ordenou que fossem queimadas na verdade estão circulando o mundo todo, isso talvez o impactasse e até abalasse seus laços de amizade com Max Brod, mas é pura especulação. Fica-se o questionamento.
O Brod já era um escritor conhecido na época, mas nunca deixou de motivar e incentivar a carreira literária de seu amigo, e isso é algo interessante, não se via resquícios de inveja uma vez que o próprio Brod reconhecia o talento absurdo de Kafka para a escrita. Aliás, após a morte de Kafka e depois de ter descumprido o testamento, Brod acabou fugindo para a palestina levando consigo os escritos de Kafka, uma vez que se os nazistas pegassem-no com certeza poriam fim neles. E ele concluiu algumas obras, eu particularmente acho que ele fez isso muito bem, sendo bastante fiel ao estilo kafkiano.
A amante dele que também guardou alguns textos foi a Dora Diamant, ela queria realmente queimá-los atendendo o pedido de seu amante mas não chegou a fazer, mas ela não os entregou ao Brod que chegou a pedi-los, penso que ela agiu mal pois se tivesse entregado os escritos a ele teríamos muito mais livros do Kafka à disposição, e a obra dele é relativamente curta mas indiscutivelmente genial.
É bem difícil eu recomendar livros dos autores que gosto porque penso que os melhores livros que a gente lê acabam aparecendo naturalmente, talvez até de forma aleatória. Deparei-me com o Kafka quando estava em uma biblioteca e vi um livro em que a capa era o rosto de um homem amedrontador, quase como aquelas fotografias de pessoas que já morreram e que parecem estranhas. Abri o livro, com certo receio, chamava-se o Desaparecido ou América e por sorte, ou pelo destino, acabei descobrindo esse gênio da literatura e apreciando-o muito, depois cheguei até a pensar que a primeira impressão que tive da foto refletiu algumas de suas obras, que chegam realmente a incomodar e causar estranheza mas que são, repito, geniais.
Valeu @"hjr_10", pelo tópico, muito bom.